Augusto Nunes foi testemunha de uma passagem curiosa, em uma noite de agosto de 1958, quando Jânio Quadros jantou na casa de seus pais. Depois da refeição, o mais esquisito político do mundo pediu um sanduíche de mortadela para dona Biloca, mulher do prefeito Adail Nunes da Silva, o anfitrião do governador, em campanha para eleger seu sucessor. Augusto recordou, em artigo recente, a surpresa da mãe, que reagiu ao pedido com “a naturalidade possível”, pois se seguiria um comício na praça, e ela já ouvira falar do truque. Enquanto um colega discursava, o candidato tirou o lanche do bolso do paletó e o comeu na frente do público.
Quarenta anos depois, na inauguração do Conjunto Habitacional Manoel Lopes Moreno, em 1998, o então governador Mário Covas aproveitou a grande concentração popular para contar que adorava pastel. A repórter Tatiana Nascimento, que ainda trabalhava na EPTV Ribeirão (hoje está na Globo do Rio), soltou uma gargalhada. Riu mais ainda quando ouviu Covas dizer que, não importava a hora que chegasse em casa, pedia para mulher fritar seu salgadinho preferido. Com certeza o governador não tinha a mesma cara-de-pau de Jânio, a ponto de sacar do bolso um pastel de carne e engoli-lo em público. Pelo menos não durante um comício.
A cobertura da imprensa na campanha eleitoral deste ano mostra que a tática do pastel continua em evidência. Todas as noites, os repórteres do “Jornal Nacional” informam que Alckmin, Mercadante, Russomano e companhia pararam no bar da esquina para comer um pastel e tomar um cafezinho. Ao morder a massa retangular, recheada de carne moída, palmito ou queijo, o candidato quer dizer que é do povo, está no mesmo nível do trabalhador que, ao sair do trabalho, entra no botequim, bebe uma pinga e come uma salsicha em conserva.
O truque do pastel é tão recorrente que não é possível mais rotular apenas um candidato como “cara de pastel”. Todos aderiram a ele, sem a menor preocupação com a saúde. Que cardiologista teria a coragem de recomendar ao candidato-paciente que não exagerasse no pastel? O médico poderia ouvir: “Mas, doutor, justo agora, em plena campanha!” Certamente, os pastéis não chegam a pesar no orçamento dos políticos nem o TSE vai exigir a contabilidade de quantas unidades eles ingeriram. Mas que é engraçado é.
Apenas um candidato vai ganhar a eleição, seja no primeiro ou no segundo turno. Mas, na base do “o que não mata engorda”, todos se expõem ao risco de contrair uma gastrite. A fritura não é o assunto mais premente desta campanha – há outros um pouco mais importantes, como a saúde e a educação –, porém é o mais chamativo no “pastelão” que virou a política nacional, com a possível exceção da vergonhosa quebra do sigilo fiscal patrocinada pelo PT.
NILTON MORSELLI
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