segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Comedores de pastel

Augusto Nunes foi testemunha de uma passagem curiosa, em uma noite de agosto de 1958, quando Jânio Quadros jantou na casa de seus pais. Depois da refeição, o mais esquisito político do mundo pediu um sanduíche de mortadela para dona Biloca, mulher do prefeito Adail Nunes da Silva, o anfitrião do governador, em campanha para eleger seu sucessor. Augusto recordou, em artigo recente, a surpresa da mãe, que reagiu ao pedido com “a naturalidade possível”, pois se seguiria um comício na praça, e ela já ouvira falar do truque. Enquanto um colega discursava, o candidato tirou o lanche do bolso do paletó e o comeu na frente do público.
Quarenta anos depois, na inauguração do Conjunto Habitacional Manoel Lopes Moreno, em 1998, o então governador Mário Covas aproveitou a grande concentração popular para contar que adorava pastel. A repórter Tatiana Nascimento, que ainda trabalhava na EPTV Ribeirão (hoje está na Globo do Rio), soltou uma gargalhada. Riu mais ainda quando ouviu Covas dizer que, não importava a hora que chegasse em casa, pedia para mulher fritar seu salgadinho preferido. Com certeza o governador não tinha a mesma cara-de-pau de Jânio, a ponto de sacar do bolso um pastel de carne e engoli-lo em público. Pelo menos não durante um comício.
A cobertura da imprensa na campanha eleitoral deste ano mostra que a tática do pastel continua em evidência. Todas as noites, os repórteres do “Jornal Nacional” informam que Alckmin, Mercadante, Russomano e companhia pararam no bar da esquina para comer um pastel e tomar um cafezinho. Ao morder a massa retangular, recheada de carne moída, palmito ou queijo, o candidato quer dizer que é do povo, está no mesmo nível do trabalhador que, ao sair do trabalho, entra no botequim, bebe uma pinga e come uma salsicha em conserva.
O truque do pastel é tão recorrente que não é possível mais rotular apenas um candidato como “cara de pastel”. Todos aderiram a ele, sem a menor preocupação com a saúde. Que cardiologista teria a coragem de recomendar ao candidato-paciente que não exagerasse no pastel? O médico poderia ouvir: “Mas, doutor, justo agora, em plena campanha!” Certamente, os pastéis não chegam a pesar no orçamento dos políticos nem o TSE vai exigir a contabilidade de quantas unidades eles ingeriram. Mas que é engraçado é.
Apenas um candidato vai ganhar a eleição, seja no primeiro ou no segundo turno. Mas, na base do “o que não mata engorda”, todos se expõem ao risco de contrair uma gastrite. A fritura não é o assunto mais premente desta campanha – há outros um pouco mais importantes, como a saúde e a educação –, porém é o mais chamativo no “pastelão” que virou a política nacional, com a possível exceção da vergonhosa quebra do sigilo fiscal patrocinada pelo PT.
NILTON MORSELLI

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