segunda-feira, 6 de junho de 2011

Léo, o homem que recuperava vidas


NILTON MORSELLI

Só quem já teve uma pessoa da família recuperada da dependência química pode reconhecer integralmente a importância de Leonildo Delfino de Oliveira, o Léo. O fundador da comunidade terapêutica Horto de Deus perdeu a luta contra o câncer na madrugada do último domingo (29), depois de um longo período de sofrimento. Ele estava internado havia quase duas semanas na Unidade de Terapia Intensiva da Santa Casa.
Léo nasceu há 64 anos na turística Poços de Caldas, filho de Benedito Delfino de Oliveira e Ana Lúcio Delfino. Seus irmãos: Benedito, Nadir, Maria Luiza, Neusa, Marcílio e Magali. Nadir e Marcílio moram nos EUA para onde Léo quase foi nos anos 1980. Não viajou porque atendeu a um pedido do padre norte-americano Haroldo Rahm, criador da Fazenda do Senhor Jesus, em Campinas, onde Léo se livrou das drogas.
O então prefeito de Taquaritinga, Milton Nadir, pediu ao padre a abertura de uma instituição igual. O jesuíta designou seu pupilo. “Era para ele ficar só seis meses”, contou Susana Lemos de Oliveira, uma das responsáveis por Léo nunca mais arredar pé da cidade. Ele chegou em outubro de 1989 e, em março do ano seguinte, conheceu a mulher com quem se casaria em 3 de fevereiro de 1992.
O Horto de Deus se instalou no Horto Florestal Tenente Valdívio Gonçalves de Almeida. Lá, em acanhadas dependências, iniciou um trabalho inédito de internar e tratar gente que vivia mergulhada nas drogas e ou na bebida alcoólica. Em 22 de novembro de 1996, fim da administração do ex-prefeito Tato Nunes, inaugurou as instalações do Horto de Deus. Das pessoas de Taquaritinga, nunca cobrava nada pelo tratamento.
Ao longo de duas décadas, mais de mil pessoas passaram pelo Horto de Deus. Se não há estatísticas oficiais sobre o índice de recuperação, uma boa mostra pôde ser verificada no velório do homem que recompunha vidas destruídas. Centenas de ex-adictos, de Taquaritinga e da região, renderam-lhe as últimas homenagens. Seu corpo foi velado na Loja Maçônica Líbero Badaró. Iniciado na ordem maçônica em 1980, em São Paulo, chegou a mestre em 4 de abril de 2008.

Artista – Além de ser um profundo conhecedor da dependência química, Léo tinha um lado artístico que aflorou desde cedo, lembrou a irmã Neusa. Na juventude, participou de festivais de música em Poços e chegou a competir em uma edição dos famosos festivais da TV Record, nos anos 1970. Tocava violão, compunha, era seresteiro e até gravou um disco na era do vinil. Quando tinha uma reuniãozinha, não perdia a oportunidade de brindar os amigos com sua bela voz.
Mas foi na arte de resolver problemas alheios que Léo mais se destacou. Frequentava o Fórum quase todos os dias, intervindo por pessoas que praticavam desinteligências em razão da dependência química. Sabia que a cadeia só pioraria as coisas. “O dependente é um doente que merece ser tratado”, repetia. Como ninguém, tinha livre trânsito na sala de juízes e promotores.
Depoimento – Como jornalista profissional, minha primeira reportagem foi com Léo. Isso aconteceu em 1992, quando ele proferiu uma palestra a funcionários do grupo empresarial de Vanderlei Marsico. Na época, a aids era uma doença mortal. Em fevereiro deste ano, Léo me concedeu a última entrevista no leito da Santa Casa, para a produção de um texto para o jornal institucional “Saúde Sempre”. No mês seguinte, começo da noite de sábado, o último contato foi um diálogo muito prazeroso, de uns 10 minutos, na Padaria Central.
Ao longo de sua vida em Taquaritinga, mostrou que um “forasteiro” pode fazer muito mais do que uma pessoa nascida na própria cidade, mas que não tem compromisso com a ética, a verdade – e muito menos com a honestidade. Com letras de ouro, Léo escreveu seu nome na história de Taquaritinga. Agora em outra esfera, como acreditamos, continuará a realizar seu trabalho em favor do semelhante.

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